Dan Ioschpe: Velocidade e complexidade impõem mais cuidado com reputação

Na segunda entrevista da série com conselheiros de administração, um olhar sobre como contribuir e assegurar a reputação nas organizações

Christianne Schmitt e Clóvis Malta

Reputação no board #2

“O conselho precisa participar do desenvolvimento da reputação, junto com a diretoria, com o resto da empresa”, diz Dan – Fotos: Jardiel Carvalho / Especial Reputation Feed

Presidente do Conselho de Administração da Iochpe-Maxion desde 2014 e integrante de conselhos de grandes empresas como Embraer, WEG, Cosan e Marcopolo, Dan Ioschpe vê a velocidade e a complexidade das mudanças nas organizações como o principal desafio de hoje em relação à construção e preservação da reputação corporativa. A transformação tecnológica, a maior disponibilidade de recursos financeiros e o avanço na qualificação das pessoas fazem com que tudo seja mais acelerado na rotina das empresas. E reputação tem tudo a ver com a gestão corriqueira das organizações, diz o conselheiro nesta entrevista exclusiva ao Reputation Feed.

A conversa com Dan é a segunda da série que será apresentada ao longo das próximas semanas com reconhecidos conselheiros no país. A intenção é mostrar como esses colegiados, responsáveis pelas principais decisões estratégicas das empresas, avaliam e endereçam a gestão de reputação nas organizações, bem como traduzir o impacto da construção e do desenvolvimento da cultura reputacional a partir do olhar dos conselhos de administração.

Confira, a seguir, os principais trechos desta entrevista:

“Sob o ponto de vista de reputação, um dos grandes desafios dos conselhos é a complexidade diante da velocidade em que tudo acontece”

Um dos grandes desafios dos conselhos de administração sob o ponto de vista de reputação é que as empresas, diante da velocidade em que tudo acontece, estão cada vez mais complexas, mais sofisticadas, e isso impacta o trabalho não só do gestor, mas, também, dos conselhos. Tomando por base os Estados Unidos, onde há mais estatísticas disponíveis, percebe-se que, por conta dessas transformações aceleradas, as empresas líderes da atualidade foram criadas há poucos anos e que houve, no período, uma grande mortalidade de organizações. Então, eu não diria que as organizações e os seus conselhos não estavam atentos a isso; na prática, a complexidade aumentou muito.

Prefiro pensar no todo, devido à horizontalidade do assunto reputação

“Mais chip, mais dinheiro, mais pessoas: desenvolvimento nunca imaginado”

Talvez o tempo de vida das organizações como a gente se acostumou a ver não seja o mesmo no futuro. Não significa dizer que não haverá empresas longevas, mas tem uma outra avenida de ciclos mais curtos e muito ascendentes, que se espalham com rapidez. A dinâmica é muito mais competitiva pela velocidade e pela complexidade, fruto de tecnologia, pois os saltos tecnológicos estão acelerados; de dinheiro, que a geração de riqueza coloca à disposição para projetos; e pessoas, porque houve avanço na educação e no desenvolvimento pessoal. Então, com mais chip, mais dinheiro, mais pessoas, você consegue fazer desenvolvimento nunca antes imaginado, numa curva de aceleração muito grande. E esse é o desafio de gerir empresas.

“Reputação tem a ver com a condução corriqueira dos negócios”

Na experiência prática, a gente pode ganhar ou perder reputação em qualquer área do negócio, de relacionamento, das cadeias em que as empresas estejam envolvidas. Sempre prefiro pensar no todo como conselheiro, devido à horizontalidade do assunto reputação. A gente costuma pensar em reputação, na maioria das vezes, mais em relação a eventos, às vezes fortuitos. Mas você pode se antecipar, pois reputação também tem a ver com a condução corriqueira dos negócios, com os resultados empresariais. No fim do dia, tudo acabará contando nesse combo da reputação.

“O que a empresa está fazendo é o que vai contar no reloginho dela. E o que não está fazendo também”

O dia a dia da organização é o fazer. O que a empresa está fazendo é o que vai contar no reloginho dela. E o que não está fazendo também. Não só o não fazer, o não ter ido na direção correta, mas também o se omitir. Hoje em dia, com o grau de comunicação, de conhecimento das situações, a omissão é algo extremamente complicado e grave. Empresas e entidades não podem conviver com a omissão, que torna a teia da reputação ainda mais complexa. Você tem que ser proativo, trazer o problema à baila e resolvê-lo.

“O conselho precisa participar do desenvolvimento da reputação”

O papel de um conselho na reputação de uma organização é muito amplo. O conselho precisa participar do desenvolvimento da reputação, junto com a diretoria, com o resto da empresa. Precisa desenvolver as estruturas que protegem e mantêm a reputação, o que, na minha opinião, é absolutamente horizontal. Você está falando da empresa como um todo. Você precisa integrar todos os tópicos. Precisa entender todos os aspectos que estão dentro da formação e da manutenção de uma reputação, que são todos, e trabalhar com eles o tempo todo.

“O bom em um conselho é escutar uma ponderação que difere do foco da sua”

Você precisa de uma matriz dentro de um conselho, assim como uma diretoria ou qualquer organização. É preciso ter um leque de competências, e cada um vai trazer para a mesa algumas delas, senão dois conselheiros seriam suficientes. É para isso que é custeada uma visão mais colegiada, que traz informações diversas. O bom em um conselho é justamente ter essa condição de olhar para o lado e escutar uma ponderação que difere do foco da sua, porque partiu de uma outra perspectiva, de uma outra necessidade que é tão vital quanto a sua para a sustentabilidade do negócio.

Isso deve virar uma Torre de Babel? Não, senão vira uma assembleia

“Em um grupo de conselho, é preciso navegar em alguns territórios que antes não eram demandados”

Em um grupo de conselho, você é preciso ter todas as pessoas, mas é preciso ter a condição de navegar em alguns territórios que antes não eram demandados. Podem ser tecnologia, relacionamento interpessoal, questões de gênero. Quanto maior a diversidade obtida, melhor. Agora, isso deve significar uma Torre de Babel? Não. Precisa ter uma organização. Você tem que elencar todas essas questões e tentar, na medida do possível, cobri-las com esse grupo que também não pode ser de 60 conselheiros, senão vira uma assembleia.

“ESG é questão que permeia todo o tecido empresarial e todo o seu ecossistema”

Se a questão ESG começar em algum lugar da empresa – na sua matriz de emissão de carbono ou na diversidade de seu quadro de colaboradores –, você vai descobrir que não vai parar por aí. Vai envolver a comercialização de seus produtos, a imagem de sua empresa, o tipo de atratividade que terá ou não para colaboradores, clientes, fornecedores, e por aí vai. A condição é você estar pari passu com a tecnologia, e tudo acaba se envolvendo. ESG permeia, assim como a reputação, todo o tecido empresarial e todo o seu ecossistema.

“O conselho precisa se educar em áreas que não eram da sua atuação”

É importante que os membros do conselho tenham entendimento da realidade, da relevância e da abrangência do ESG. O conselho precisa se educar, eventualmente, em áreas que não eram tradicionalmente as de sua atuação. Com uma visão de cima para baixo, vai ajudar e levar a diretoria e o restante do corpo organizacional a buscar (esse entendimento). E aí, claro, vai monitorar aquilo que está sendo realizado dentro da empresa e vai estar ativo, verificando tendências, se atualizando, fazendo uma retroalimentação disso a cada momento.

Sustentabilidade da empresa é uma peça-chave da reputação

“Se faltarem pernas, busque alternativas para preservar a sustentabilidade”

A questão longo prazo versus resultados imediatos é histórica e estará sempre colocada. Agora, quando se trata da sustentabilidade de uma empresa – que também é uma peça-chave em reputação, porque se a empresa não é sustentável, ela termina –, precisa pensar dessa forma. Se não há pernas e pulmão para fazer tudo num determinado momento em sustentabilidade, é preciso fazer na medida da própria condição. Se esse tamanho de perna, se esse ar no pulmão é pequeno demais e os passos a serem dados também não são sustentáveis, é preciso voltar dentro do conselho, eventualmente, até com um grupo de acionistas, e verificar se existem alternativas para que a sustentabilidade seja preservada. Não se trata necessariamente de fazer mais curto ou longo prazos. É preciso pensar no atingimento dos objetivos, como faz esse deployment, esse lançamento das ações num mapa temporal que não seja nem muito menor nem muito maior do que a sustentabilidade demanda.

“Organizações precisam se estruturar contra fraudes e atualizar mecanismos constantemente”

Sem entrar em casos específicos de fraudes contábeis, entendo que as empresas têm os conselhos, os acionistas, e que também podem ser envolvidos o conselho fiscal, o conselho de administração, comitês, entes externos, auditores, bancos, credores – quanto mais os instrumentos e os corpos de verificações e balanceamentos estiverem funcionando, mais improvável é que se tenha grandes surpresas. É preciso fazer isso e atualizar esses mecanismos constantemente.

“Alguma atividade presencial é essencial para a difusão da cultura organizacional”

Como é que se trabalha o distanciamento físico e a cultura? Os conselhos e as diretorias estão debruçados em cima disso. Então, de um lado, há economicidade, uma funcionalidade enorme em sistemas à distância. Por outro, há histórias em que a difusão cultural dentro da empresa perdeu pelo virtual em relação ao presencial. As empresas que estão se saindo melhor nisso estão trabalhando nos dois lados. Um pouco de regramento no sentido de dizer: olha, vamos ter flexibilidade, mostrar o lado bom, mas, infelizmente, os que são opostos a qualquer tipo de presencial, talvez acabem tendo que revisar sua posição na organização. Se a gente concluir que alguma atividade presencial é fundamental para a difusão de cultura, e a difusão da cultura é fundamental para a sustentabilidade e a reputação da empresa, você fará o quê? Vai dizer: vamos viver com esse risco? É difícil. As pessoas, em geral, entendem isso, mas tem que ser bem trabalhado.

“Emissões (de carbono) são um tema-chave em um futuro muito próximo”

Emissões (de carbono) são um tema-chave em um futuro próximo. É um tema super sofisticado, cheio de oportunidades e ameaças em que as empresas têm que se debruçar. Não sou um especialista na área, mas leio muito sobre a questão ambiental e o aquecimento global. Se eu fosse elencar um só, diria que esse é um assunto fortíssimo do próximo triênio, dos próximos cinco anos, até que a gente chegue a uma situação em que possa olhar e dizer: puxa, aparentemente, estamos numa trajetória mais controlada para evitar um grande desastre.


Mais sobre Dan Ioschpe

Admirador de livros, principalmente os de literatura, e sempre atento ao que é publicado sobre sustentabilidade e transformação digital, Dan Ioschpe tem dedicada atuação em instituições empresariais. É membro do Conselho do Sindipeças, da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), do qual foi presidente, além de vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Como presidente da Iochpe-Maxion, a partir de 1998, comandou o processo de internacionalização da empresa, que tem hoje cerca de 17 mil funcionários em mais de trinta unidades pelo mundo. 

Christianne Schmitt é editora do Reputation Feed e Clóvis Malta é jornalista
christianne.schmitt@ankreputation. com.br
clovis.malta@ankreputation.com.br


• Na próxima entrevista da série Reputação no board: Leila Loria, que contribui para conselhos de empresas como Assaí, Pernambucanas e Moinhos Anaconda.

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