
O documentário “Titan: o Desastre da OceanGate”, recém-lançado pela Netflix, que retoma a tragédia da expedição submersível ocorrida em 2023, oferece também perspectivas para refletir sobre gestão de riscos e crises de imagem. Na época, o mundo assistiu assombrado às buscas e a tentativa de resgate das cinco vítimas do acidente ocasionado pela implosão da embarcação, criada para realizar viagens turísticas até os destroços do navio Titanic, a 3,8 mil metros de profundidade no Atlântico Norte.
Com quase duas horas de duração, o filme foi realizado a partir da narrativa de ex-funcionários da OceanGate, a empresa que desenvolveu o Titan sob o comando do empresário Stockton Rush, um dos passageiros mortos na tragédia. O documentário oferece muitas camadas sobre o caso, mas, aqui, o foco é trazer à luz aspectos centrais do gerenciamento de riscos e crises de reputação. Sem menosprezar a tragédia propriamente, a intenção é tratar sobre gestão de risco e de crise reputacional especialmente em contextos marcados por inovação, alta exposição pública e tomada de decisão sob incerteza.
Toda crise um dia já foi um risco
No centro do desastre, está uma cultura corporativa de negligência aos riscos, que, segundo colaboradores da OceanGate, ignorou alertas técnicos. O caso evidencia a importância de estruturas robustas de governança e de gestão de riscos, imprescindíveis em projetos de alto grau de criticidade como o do Titan, que ameaçam não apenas a sustentabilidade e a perenidade da operação, mas sobretudo a vida de pessoas.
Segundo relatos de ex-funcionários, a segurança do submersível era questionada internamente. Havia preocupações em relação ao uso de materiais não-convencionais e à ausência de regulações externas obrigatórias para embarcações desse tipo.
Compliance é aliado, não obstáculo
Em nome da disrupção, a OceanGate operou fora das exigências regulatórias e, segundo o documentário, avançou mesmo com alertas feitos por engenheiros e especialistas. A empresa não fez certificações independentes e adotou o uso de materiais experimentais – como a fibra de carbono no casco – sem respaldo técnico.
Em gestão de crise, a ausência de validação externa pode expor vulnerabilidades à reputação da empresa, especialmente quando a percepção pública associa essa postura à negligência ou à falta de diligência organizacional.
E mais ainda quando as consequências são de grande gravidade como a morte de pessoas. O equilíbrio entre inovação e segurança é um desafio constante para empresas que buscam transformar o mercado por meio de novas soluções e/ou experiências tecnológicas.
A resposta falha: ausência de plano, excesso de silêncio
Quando a crise eclodiu, não houve porta-voz preparado, nem estratégia clara de comunicação. O que se viu foi um vácuo preenchido pela imprensa e por familiares das vítimas.
A falta de preparo para responder no timing certo a dúvidas e esclarecer sobre pontos importantes relacionados ao sinistro em momentos sensíveis tende a ampliar os danos reputacionais e reforça a ideia de que a empresa nunca teve controle da situação.
Em casos como esse, de alto risco e com potencial de repercussão pública mundial, chama atenção a falta de planos de contingência claros e efetivos.
Reputação: o ativo mais difícil de reconstruir
Hoje, a OceanGate não existe mais. Sua reputação virou estudo de caso global sobre fracasso em gestão de riscos e crises. O documentário ajuda a cristalizar essa imagem não como um acidente, mas como uma tragédia anunciada.
Quanto maior a repercussão pública negativa, ainda mais quando envolve perda de vidas humanas e grande choque emocional, mais longo, caro e tortuoso será o caminho da reconstrução e da reconquista de confiança.
Em alguns casos, sequer será possível. Por isso, a gestão de riscos e ameaças reputacionais deve ser encarada como uma prioridade na agenda de acionistas e executivos C-Level.

Mariana Azevedo é jornalista e gerente de Negócios e Marketing da ANK Reputation
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