O líder deve atuar com equilíbrio, mesmo em momentos difíceis, sem descuidar do longo prazo para que a empresa seja cada vez mais respeitada – Foto: Shutterstock
Quando penso no líder corporativo de hoje, lembro da clássica imagem do profissional equilibrando bandejas entre mesas de passageiros numa embarcação em mar revolto. O líder de uma empresa precisa transmitir confiança a todos os stakeholders mesmo sob turbulência de um mundo cada vez mais interdependente. Neste começo de 2023, os líderes são provocados a refletir sobre o seu papel no fortalecimento da reputação das empresas, em cenários adversos e de alta incerteza. São questionamentos que surgem à luz do potencial de dano de suas decisões à imagem e à reputação de marcas fortes, sem falar dos prejuízos causados à economia, ao mercado, e do abalo de confiança, que joga mais incertezas no mundo corporativo em relação a seus controles e métricas.
Vejo como uma oportunidade para repensar a influência do modelo de gestão focada no curto prazo, da pressão por resultados imediatos, da sedução dos bônus e até mesmo da ênfase na agenda individual em decisões que colocam em risco toda uma estrutura empresarial com inúmeras ramificações. Qual a expectativa dos stakeholders e quais posturas e atitudes são esperadas de quem lidera?
Desse novo CEO, é exigida uma visão holística da atuação da empresa e sobre seu próprio papel. Gestores que buscam uma perspectiva multistakeholder e que se pautam por uma governança baseada em valores praticados no cotidiano, traçam um planejamento com visão de longo prazo, valorizam a boa governança, a ética e a prática diária dos valores da empresa, dedicando tempo ao fortalecimento da cultura da organização. E isso significa dizer alguns “nãos”, deixar de lado caminhos mais fáceis, e, por outro lado, incorporar a interseção entre a PF (Pessoa Física ou CPF) e PJ (Pessoa Jurídica ou CNPJ), que passam a ser um único corpo, o “líder-empresa”, onde os vasos comunicantes são permanentes.
“Não há dúvidas quanto à importância do fluxo de caixa e dos resultados. A diferença é a forma como são alcançados.”
Paul Polman, em seu livro Impacto Positivo, escrito em coautoria com Andrew Winston, narra a proposta de aquisição da Unilever, da qual era CEO na época, pela Kraft Heinz. Coube-lhe enfrentar o dilema: entregar ou não uma empresa com uma cultura de valorizar todas as partes interessadas, todos os stakeholders, para a um comprador conhecido pela cultura fortemente focada nos cortes de despesas, e com uma gestão orientada para o shareholder. Não há dúvidas quanto à importância do fluxo de caixa e dos resultados. A diferença é a forma como são alcançados. Ao optar pelo não, o autor permitiu que a empresa seguisse levando a todos o impacto positivo que dá título ao livro.
Numa empresa com cultura corporativa forte, imprescindível para o sucesso, tudo o que se desvia do que é a essência e o propósito pactuado é automaticamente rejeitado. E assim mantém-se a coerência no relacionamento com seus diferentes públicos, o que tem grande valor para preservar a reputação. Na liderança desse processo, o líder focado em reputação tem consciência de que seu papel é gerir complexidades, atuando no curto prazo sem descuidar do longo prazo e da consistência de resultados, resistindo às pressões imediatistas. Quando não age assim, se desconecta do que a empresa tem como maior fator de sucesso, o engajamento e a confiança de seus públicos. Ao persistir, como o profissional descrito no início, equilibrando-se mesmo em águas agitadas, faz com que a empresa seja cada vez mais respeitada e admirada, o que, no final, gera impacto positivo para os negócios.
Lorival Luz é membro do Conselho de Administração da Inter&Co
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