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Ao longo de uma trajetória empresarial, sempre haverá momentos difíceis e crises, que podem ser provocadas por questões externas, fora do controle da empresa, ou por fatores internos, desde falhas operacionais, erros de estratégia, posicionamentos polêmicos de lideranças, assuntos ligados às demandas ESG e até má-fé e sabotagem, para ficar em alguns exemplos. São eventos mais frequentes do que costumamos pensar, especialmente em organizações longevas.
Algumas vezes, o dano causado à reputação é tão severo, que não pode ser mitigado com expertise técnica, relacionamento ou experiência no mercado, por melhores que sejam
Algumas vezes, o dano causado à reputação é tão severo, que não pode ser mitigado com expertise técnica, relacionamento ou experiência no mercado, por melhores que sejam. A empresa perde o que se pode chamar de “licença (da sociedade) para operar”. As empreiteiras brasileiras envolvidas na Lava-Jato, por exemplo, sofreram um abalo de reputação tão severo que algumas grandes do setor optaram por remodelar o negócio com novas marcas e recomeçar praticamente do zero em termos de relacionamento com seus stakeholders.
Não há dúvida que o setor inteiro de infraestrutura brasileiro foi afetado de alguma forma e, mesmo empresas que passaram longe dos escândalos, foram obrigadas a reforçar suas regras de compliance e códigos de conduta e, ainda, comunicar isso aos seus públicos com bastante ênfase. Como quase tudo tem dois lados, aquelas com reputação sólida, tiveram vantagens e venceram licitações a partir deste diferencial.
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Reproduções do Brazil Journal – 25.01.2023 (no alto) e do Valor Econômico – 13.02.2023 (abaixo)
Agora, com a crise da Lojas Americanas, ocorre uma situação similar, com outras marcas de varejo tendo de tomar medidas em função de dúvidas que surgiram em relação à consistência das demonstrações financeiras no setor. A exposição negativa da varejista também repercutiu no valor em bolsa de diversas empresas de capital aberto, em bancos, gestoras de investimentos, empresas de auditoria e nas taxas de financiamento, que subiram.
“Empresas com reputação forte fazem bem não só para elas, mas para o mercado como um todo. Nunca se deve desejar ou estimular uma crise de imagem e de reputação de um concorrente, porque pode afetar o setor inteiro e até o conjunto da economia, dentro e fora do país”, afirma Anik Suzuki, CEO da ANK Reputation.
Com reputação forte, empresas resgatam confiança dos stakeholders
Os benefícios de uma reputação forte também ficam evidentes quando a empresa enfrenta uma ocorrência negativa e tem a confiança de seus stakeholders temporariamente abalada, porém, dá a volta por cima, é resiliente, supera o episódio e segue admirada e na preferência dos públicos. Grandes empresas assíduas em rankings de valorização e reconhecimento registram momentos de dificuldades ao longo de sua trajetória
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Apple está entre mais valiosas do mundo – Foto: Shutterstock
A Apple está entre os maiores exemplos de resiliência. Enfrentou momentos dramáticos em 1990, quando Steve Jobs deixou a empresa (retornaria, posteriormente), reagiu na década seguinte e, desde o lançamento do iPhone, em 2007, voltou ao topo das mais valiosas do mundo, superando, inclusive, o falecimento de Jobs, que carregava na sua própria imagem atributos relevantes para a reputação da marca.
Em 2023, apesar da recessão no setor de tecnologia, que a fez perder o equivalente a US$ 57,6 bilhões em valor de marca no ano, segue na segunda posição do estudo Brand Finance Global 500, um dos mais reconhecimentos rankings internacionais, antecedida pela Amazon. Mesmo com momentos de baixa, a Apple mantém milhões de consumidores fiéis ao redor do mundo, que lhe asseguram respirar novamente a cada abalo do negócio. Isso é reputação.
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Empresas bem-preparadas conferem dimensão estratégica à reputação
Entre as empresas que estão mais bem preparadas para enfrentar adversidades e até crescer em cenários turbulentos, estão as que têm se ocupado de compreender o impacto da reputação corporativa no negócio, assim como a sua dimensão estratégica. Isso porque cada ponto de contato com cada stakeholder é importante para construir reputação – e para preservar o que já foi conquistado.
A construção de reputação tem de permear toda a organização, uma vez que ocorre dia a dia, com consistência entre o que a empresa faz para dentro e para fora, em todos os seus relacionamentos. Envolve ter um produto de qualidade, clientes satisfeitos, um comportamento ético em todos os relacionamentos, estabelecer relações do tipo ganha-ganha com a cadeia de valor, cuidar do ambiente interno e das suas pessoas, entre outros.
Uma pesquisa da consultoria Weber Shandwick, em parceria com a KRC Research, lançada em 2020 reiterou que reputação é multifatorial, além de ser um ativo essencial para os resultados financeiros da empresa. O principal achado do estudo The State of Corporate Reputation in 2020: Everything Matters Now é que a reputação de uma empresa é influenciada por diversos fatores, sem que nenhum tenha maior impacto do que todos os demais. Essa falta de distinção sugere que as empresas não podem mais se concentrar e priorizar apenas alguns fatores-chave de reputação. Tudo importa: da performance dos colaboradores à qualidade dos produtos, do desempenho financeiro à cultura corporativa.
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Magalu: Empresa e acionista acumulam reconhecimento – Foto: Divulgação
A Magazine Luíza é um exemplo de reputação multifatorial: é uma das empresas listadas em bolsa que mais se valorizou na última década (mais de 1.000% entre 2011 e 2020, dados da consultoria Economática), é a melhor empresa do varejo para se trabalhar (GPTW 2022) e seu rosto institucional, a empresária Luiza Trajano, acumula, por cinco vezes, a primeira posição como líder de negócios com melhor reputação no Brasil, de acordo com o ranking da consultoria espanhola Merco (edição 2022).
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“Quando a empresa tem uma proposta de valor clara, atende às necessidades do mercado, se relaciona e se comunica consistentemente com seus stakeholders, ela tem uma reputação sólida, que a mantém em crescimento, com lucro e no topo dos rankings de reconhecimento e valorização. Também tem maior possibilidade de financiar a inovação e a disrupção para continuar relevante em situações difíceis, assim como nas mudanças de ciclos econômicos e de comportamentos de seus públicos”, reforça Anik.
Lucia Ritzel é Consultora Sr. e Head de Conteúdo da ANK Reputation
lucia.ritzel@ankreputation.com.br